terça-feira, 31 de março de 2015

aqui onde a lua projeta sua luz
do lado de dentro da janela
brotou, no piso mesmo, de porcelana
uma árvore de afinar vozes e violões
movida a noite e contemplação

quarta-feira, 25 de março de 2015

Marte invade

distante dos alarmes ria até morrer
o que são macaquices para alguém nada ideal?
são quatro os motivos do canto:
benção, oração, sentidos, a razão de ser
a distância revela o que queremos fazer
a vida é o oposto do que me falou
não era pra ser
mas hoje é dia de morte na tv
hoje é dia em que Marte invade as geladeiras.

* entre os 2000 e 2001
cada vez me convenço mais de que para saber sobre o caráter de um homem, basta ver como ele trata seu filho, principalmente em momentos íntimos e solitários.

quinta-feira, 19 de março de 2015

15 anni

primeira valsa
primeiro não
primeira taça de ingratidão
e a soma dos desejos desfeitos
a noite exala desamor

calor é o tempo
e o espelho da moral impacienta o peito
faz vezes de são e de isento
me fere com seu desalento
o encanto necessário não tenho
não encontro em qualquer canção

* lá por 2000

terça-feira, 17 de março de 2015

meu corpo enrijece na mesa de trabalho, a coluna arde, as costas acusam a idade. salto da cadeira para o meio da grande sala, canto um verso bruto, Neruda ou Maiakovski, os colegas bocejam de canto de olho. acordo do devaneio com fome de maçã.

sábado, 14 de março de 2015

o saber é bruto porque o coração é falho

sexta-feira, 6 de março de 2015

uma música, uma fita

há uma particularidade (não sei se vantagem) em ser músico autodidata desregrado. um belo dia você se depara com uma composição qualquer, gravada em alguma matéria obsoleta. ao ouvir o registro magnético, desafinado e descompassado pelo tempo, seu coração dilacera. há vida. há muita vida. mas essa música não mais lhe pertence. assim como está, está morta. interpretá-la parece impossível. porque você não reconhece os acordes, não há como entender a afinação, é uma espécie de filho bastardo, perdido entre tantos outros seres desconhecidos a vagar sonoramente pelas ruas. mas a nostalgia é impulso vital audacioso, audacioso e persistente. e quando você nem imagina já está lá, tentando tocar, de ouvido sua própria composição. é como se você quisesse ouvir, pela primeira vez, o lamento de um filho que há muito vive longe, por negligência sua. por sua negligência. essa música morreu em seus braços, ela agoniza no magnetismo da fita, que quase não mais responde ao leitor, des-imantada. o compositor é o polo negativo, é o buraco negro, o fragmentador de galáxias. tudo morreu em suas mãos pela teimosia do silêncio, pela incompreensão do seu público, pela falta de persistência ou pela ausência de qualidade? a qualidade de ser ruim e ruidoso habita essa fita. e você a desvenda como se pudesse exaltar com erotismo um brinquedo novo. que é seu, mas só preserva sua saliva, agora livre das bactérias da infância. quando você reinterpreta esse som, quando uma vez mais o desvenda, desde essa obscuridade latente das mensagens perdidas, em garrafas plásticas, tão artificiais e sem glória, com inveja do vidro, você não se depara somente com mais uma música perdida. primeiro você estranha a si mesmo, não compreende essa lógica pretérita, anterior, ultrapassada, segundo a qual agiam seus dedos e língua e braços e pensamento. você não se reconhece, você se distancia como um conquistador, ou como um bêbado. e foge, fustigado pela ignorância de não saber quem você é. mas ao passo que encontra a afinação, ou adapta o violão e a vida a essa outra esfera da existência, esse registro nauseabundo repleto de energia, quiçá uma vida adolescente, onde a libido pungia acordes, você reencontra um desenho lógico. ou ilógico. um percurso estranho realizado naquele tempo. revivido agora. uma psicanálise muda, mas sonora. você está a reconstituir seus processos mentais, percursos de instinto e de expressividade, de choque material, de descoberta criativa, de dor pela incompletude, frustração por incompetência. você só atingia esse estágio. você não era um músico. você não é um músico. você não é um poeta. você é um colecionador de poeiras cósmicas materializadas em vidas de passagem. vidas áridas regadas a bailes e harmonias musicais. reviver estas músicas é como desbravar as reentrâncias neuronais, é como mergulhar despido de desejo nas próprias tripas, tentando resgatar um fétido aroma de existência. refazer traçados mentais como se fosse possível repensar, reproduzir impulsos elétricos dos prótons. a ver se reconfiguram-se em ondas ou partículas, em música ou ruído. mais do mesmo, que é tão novo em si.
um tempo em que os melhores conselheiros amorosos, Lowe Pornhub e Lincoln Redtube, aconselham sem palavras.

terça-feira, 3 de março de 2015

espero
austero
o sim e o não
do quero-quero