quarta-feira, 31 de agosto de 2016

e da festa democrática das ruas descarrilou um trio elétrico desgovernado que atropelou a democracia.

terça-feira, 30 de agosto de 2016

eu queria um poema de resistência
mas hoje só tenho o tom cordial
de um velho livro abandonado
a ser escrito

domingo, 21 de agosto de 2016

corra atrás da máquina, morra atrás da máquina, é o máximo de humanidade que alcançará.

sexta-feira, 19 de agosto de 2016

viver é podar o sonho, sem decepar o caule, sem querer.

terça-feira, 16 de agosto de 2016

madrugada

o vento assobia à lua em assédio
e eu, puro tédio, reconto as estrelas

quinta-feira, 4 de agosto de 2016


há uma particularidade (não sei se vantagem) em ser músico autodidata desregrado. um belo dia você se depara com uma composição qualquer, gravada em alguma matéria obsoleta. ao ouvir o registro magnético, desafinado e descompassado pelo tempo, seu coração dilacera. há vida. há muita vida. mas essa música não mais lhe pertence. assim como está, está morta. interpretá-la parece impossível. porque você não reconhece os acordes, não há como entender a afinação, é uma espécie de filho bastardo, perdido entre tantos outros seres desconhecidos a vagar sonoramente pelas ruas. mas a nostalgia é impulso vital audacioso, audacioso e persistente. e quando você nem imagina já está lá, tentando tocar, de ouvido, sua própria composição. é como se você quisesse ouvir, pela primeira vez, o lamento de um filho que há muito vive longe, por negligência sua. por sua negligência. essa música morreu em seus braços, ela agoniza no magnetismo da fita, que quase não mais responde ao leitor, desimantada. o compositor é o polo negativo, é o buraco negro, o fragmentador de galáxias. tudo morreu em suas mãos pela teimosia do silêncio, pela incompreensão do seu público, pela falta de persistência ou pela ausência de qualidade? a qualidade de ser ruim e ruidoso habita essa fita. e você a desvenda como se pudesse exaltar com erotismo um brinquedo novo. que é seu, mas só preserva sua saliva, agora livre das bactérias da infância. quando você reinterpreta esse som, quando uma vez mais o desvenda, desde essa obscuridade latente das mensagens perdidas, em garrafas plásticas, tão artificiais e sem glória, com inveja do vidro, você não se depara somente com mais uma música perdida. primeiro você estranha a si mesmo, não compreende essa lógica pretérita, anterior, ultrapassada, segundo a qual agiam seus dedos e língua e braços e pensamento. você não se reconhece, você se distancia como um conquistador, ou como um bêbado. e foge, fustigado pela ignorância de não saber quem você é. mas ao passo que encontra a afinação, ou adapta o violão e a vida a essa outra esfera da existência, esse registro nauseabundo repleto de energia, quiçá uma vida adolescente, onde a libido pungia acordes, você reencontra um desenho lógico. ou ilógico. um percurso estranho realizado naquele tempo. revivido agora. uma psicanálise muda, mas sonora. você está a reconstituir seus processos mentais, percursos de instinto e de expressividade, de choque material, de descoberta criativa, de dor pela incompletude, frustração por incompetência. você só atingia esse estágio. você não era um músico. você não é um músico. você não é um poeta. você é um colecionador de poeiras cósmicas materializadas em vidas de passagem. vidas áridas regadas a bailes e harmonias musicais. reviver estas músicas é como desbravar as reentrâncias neuronais, é como mergulhar despido de desejo nas próprias tripas, tentando resgatar um fétido aroma de existência. refazer traçados mentais como se fosse possível repensar, reproduzir impulsos elétricos dos prótons. a ver se reconfiguram-se em ondas ou partículas, em música ou ruído. mais do mesmo, que é tão novo em si.

terça-feira, 2 de agosto de 2016

nas segundas e terças fico acordado para ouvir música no único silêncio possível do centro da cidade. o caminhão de lixo, sozinho na madrugada, é meu despertador ao contrário.

segunda-feira, 1 de agosto de 2016

quanto mais perto do Olimpo
mais sede do primitivo instinto