quinta-feira, 20 de dezembro de 2012

tenho um livro velho que é de osso
osso pouco denso de agosto
do cachorro oco

terça-feira, 18 de dezembro de 2012

criar o filho
aparar arestas
amar tanto
duvidar da liberdade presente
em vias de ver futuro educado
criar o filho
plantar no peito incerteza e insuficiência
calar os prantos
com o silêncio da experiência
a experiência inútil
de um passado que se crê benevolente
que tem fé no progresso e na história
criar o filho
ou recriar o mundo?
deixá-lo livre
fedelho
insatisfeito e ácido com a natureza que o circunda
natureza morta modernista
criar o filho?
em que termos?
o filho nos inventa todo dia
ora cara de monstro
ora melhor guitarrista do mundo
ora espanto e angústia
ora braço forte e felpudo
"pai tira a farpa do meu pé"
(porque é farpa e não felpa)
seu sangue escorre pela calçada
mancha a pouca alma que ainda temos
lhe confere contornos
seu sangue é a liberdade que já não temos
não por tê-lo
por sermos criados
por termos criado a própria noção de criatura
ao invés de outra palavra qualquer
mais próxima do puro ser

desobediente e farpudo.

terça-feira, 27 de novembro de 2012

meu violão só afina em lua cheia

                   dó
                                    minguante
aqui no meu centro deslocado
mundoumbigo imundo
escrevo sinfonias com três instrumentos
pneus que cantam
alarmes que tocam
grunidos de fome de ir até a lua e comê-la inteira em bocada única
com o espeto que sobrasse
espetaria o homem que inventou o medo da noite
a caladanoitepreta borbulhante da cidade
que nos incendeia e acalenta tanto
tanto que nos divide em dois
umbigoaomeio mundo
munido de um eu profundo
mas que é raso como um pranto cheio

segunda-feira, 26 de novembro de 2012

espirro, tosse, aversões
na vertical
continuamos alérgicos amantes
Para mim, a História é isso, o tempo em que minha mãe viveu antes de mim (aliás, é essa época que mais me interessa, historicamente). Nenhuma anamnese jamais poderá me fazer entrever esse tempo a partir de mim mesmo (é a definição de anamnese) - ao passo que, contemplando uma foto em que ela me estreita, criança, junto dela, posso despertar em mim a doçura enrugada do crepe da China e o perfume do pó de arroz. (Barthes, A câmara clara, p.75)

domingo, 25 de novembro de 2012
















já não sou mais eu

segunda-feira, 5 de novembro de 2012

200 metros mar adentro
sob uma prancha
entretido pelas ondas
pelo sal e pelo frio
partilho de uma fissura sã
um dialeto maori
flutuar

e nos entretempos
ecoar filosofias de maré

entardece e bandos de pássaros
sobrevoam nossas cabeças
vão à ilha do Batuta
sou um deles
vejo minha casa
essa ilha pequena e aconchegante
cercada de pedras
próxima a beira
verde indeterminado
todos os tons
volto pra ela
entre os amigos
somos um bando
e somos felizes
o trabalho acabou
e planamos até a mata
força nas asas
macerando recompensas
vôo em si menor
até o retiro
na terra é perigoso
há muita evolução
o homem evolui muito
prefiro o Batuta
onde só ouvimos os gritos
de disputa pelas ondas
nem rema, nem rema!
(acho que é essa tradução)

terça-feira, 30 de outubro de 2012

eu olho você me captura
musa nua sem matéria
sombra branca
entre (atre)vida
aguardo encontro
porquanto morro
atrás de um só breu
que facilite o erro
habilite a carência
como utensílio doméstico
enviesado

quarta-feira, 24 de outubro de 2012



Merde Roger!!! Não consigo mais dormir.
Só entendo a beleza
como frêmito
pulso transitório
incapacidade poética

Só entendo a beleza
como súbito
inconsciente catatônico
transformação.

quinta-feira, 18 de outubro de 2012

extraio
até o último frêmito
o eu objetivo
que não tem tempo
para beijar
deitar no mar doce o puro sal

eu sistêmico
rejeita coração
pulsa por complacência
ama por indiferença
cobra caro
as feridas em pus
as gonorréias
as Nefertites
as Vênus constirpadas

e nas madrugadas
qual Maria (do João)
se revela um podre poeta
com bafo parnasiano
romântico predicado
adjetivo inconformado
pela escrita não conforme
desforme?

uma coletânea de novas expressões nos espera
o armário é frondoso
as traças sequer o circundam
o perfume exala fresco
lavanda do Nepal
filosofia rarefeita
só no nível do mar
só na cidade perfeitamente
concebida para o drama
e o isolamento
para o porre do pijama
e a engomada eucaristia
do texto

não sei mais
porque não me expresso
a língua já morreu
tento crer em Dalai Lama
que toma mais cevada do que eu
que meditando alcanço a chama
o olho mágico, deus
deito e morro um terço
o resto tem compromisso as seis

terça-feira, 16 de outubro de 2012

do talento
desoriento
me lhe
de
r
rama
mente
ebuliente

quinta-feira, 11 de outubro de 2012

um astro
muito maior
do que meu rastro
se dizia rei
hoje
eu o queimei

sábado, 6 de outubro de 2012

porque hoje é sábado
me inspiro nos diagnósticos
mais pessimistas sobre meu rim
tanto trabalho teve
e esse meu caráter
sarcástico e rabujento
lhe define a geografia
e as possibilidades

mesmo impuro, ele resiste heróico
ao lado de seu irmão mais velho
velho de tanto sal da vida.

quarta-feira, 3 de outubro de 2012

no paraíso e no retiro
de minhas expectativas
encontro certa autossuficiência
pouca ciência
reminiscência
companhias demais para um verme adicto

vim a pé de minha última morada
comprei uma bicicleta para a empregada
cuspi nos pássaros
cusparada letrada
e queros-queros
pedantes soletraram inconstitucionali...

não há constituição
não a constituição
de outra ordem penitente
isso pelo mero e eterno despudor
pelo velho e etéreo vigor
em viver as expectativas
as perspectivas mais modernas
de toda nudez
sadia e castigada
toda
mesmo calada
velada
ao meio
pelada

domingo, 23 de setembro de 2012

minha glória está nos versos que não escrevi
lugar apropriado para a glória
quando o assunto é poesia

segunda-feira, 10 de setembro de 2012

escrevendo aprendi a sentir
e a mentir
em igual desmedida
como prefere
a desleitora
desconstru
ativa
mente
inibida
pela minha libido
ou lambida?

quarta-feira, 5 de setembro de 2012

dos cálices que enxugamos
dos vermes com quem brindamos
sem culpa
passemos ao caviar
ou aos frutos silvestres
onde as damas e suas casas herméticas
nos aguardam para o pouso

o verdejar nos deslumbra
mas a crina é cinza
como se todo arco-íris o fosse
em tons daltônicos
envergonhados
da alegria que transmite
e mente esse amarelo crepúsculo 
choxo muchoxo
vacinado viroimune
como todo nosso passado
de corpo perfeito presente

rompemos com o pouco de ânsia
que dispúnhamos
e estamos na plenitude do desastre
embora o arco da boa e eterna aliança
nos remova do asilo
como o filho pródigo
banguela e brocha
louco por um despudorado
e fálico reconciliamento paterno



toda vez que eu perco o sono
eu mato e morro
e sorvo
do pouco oxigênio
que dispõe os amantes
o engano quase sempre proporcional a certeza
em meio aos cálculos e as carências
em seu sentido próprio
muito mais afável que decrépito
cresceu tão próspero como grão de centeio
em úmido meio
meio eu
meio ele
vivemos
tenho espaço na vida
mas não na agenda
páginas e papel
custam caro demais.

terça-feira, 28 de agosto de 2012

ventrículos
ventríloquos
vendidos
vencidos

não pulso
mastigo rarefeito
intertempos
já pretéritos

insípidos
incipientes
incólumes
entorpecentes

fragrâncias mudas
das amendoeiras
que mentem
cerejas verdes

domingo, 26 de agosto de 2012

o pai se desespera
a medida em que
seus erros ganham vida
embora disponha de bons acertos
desconsolados
inconsoláveis
sobre colcha familiar

sua mão maltrata veemente a argila com o ímpeto da obrigação
não teremos sol por tempo indeterminado
e moldar na chuva é tudo que um artesão
sem habilidade não quer
sobretudo quando tem o ventre
e o álibi de barro e sonha com temporais
pés enterrados na areia ondas que lambem todas experiências

água é mesmo o estado da adolescência
tratemos de secar nossas crianças
antes da próxima ressaca revolta

terça-feira, 21 de agosto de 2012

não pego carona com a doença
ela dirige muito bem
e tem pressa
faz as curvas em aceleração centrípeta
direto ao ponto
o miocárdio
o hipotálamo
a próstata
culpa dos acentos
agudos
como ela
como ela
sem sal
hipotensão

quinta-feira, 16 de agosto de 2012

vende-se alívio a granel
enquanto o PIB decresce
a tensão enrijece
e o homem adoece
por R$1,99 compra-se
filosofias e come-se filósofos
de boa tez, de muito boa tez

domingo, 12 de agosto de 2012

uma última poesia sobre pais:
o anti-herói
que cresce iluminado
pela bravata e pelo excesso
de zelo ou autoridade
deixando a morte como herança
e tantos outros ouros que
um dia também morrem
mas que ao menos ri
de forma destemperada
da minha desgraça iluminada
pelas pupilas de tantos outros
que me ignoram despreocupadamente
enquanto enterro meus dentes
agora quebrados
no barro úmido e batido
da pista de bicicross

quinta-feira, 9 de agosto de 2012

meu guerreiro está deitado
e se masturba
velado por abutres

quarta-feira, 8 de agosto de 2012

meu oráculo
canta pela manhã
e sorri a tarde
quando o futuro
está mais próximo
casa comigo?
sou aquelas
frases prontas
que te fazem feliz
(e sangrar pelo nariz)
houve um tempo
em que meu melhor momento
era a madrugada
quando eu conversava,
liturgia do acaso,
em calorosas
enfumaçadas
perspectivas
sobre ser
estar
permanecer
(en) tornar
se

entre bundas virtuais
e binários mudos
tento relembrar
esse que fui
muito menos
lido
mas mais
sabido
de um
si um
tanto mais
tantos

quinta-feira, 2 de agosto de 2012

junto cacos perdidos
em blogs fantasmas
não sei mais as senhas
não sei mais os antigos nomes
vago em purgatório imaterial
como o purgatório real
dos tempos da catequese
quando fantasmas
só nas mentiras dos padres

quarta-feira, 1 de agosto de 2012

insisto em sorver
ferro junto a camomila
da leiteira
embora ondas
bem mais faceiras
abrilhantem
com calor subatômico
a flor calmante
ofuscam e revelam
outras propriedades
tão ou mais
pertinentes
do que a própria
doçura ou alívio
(pobre
de plutônio
enriquecido
empobrecido
em microondas
de alívio)
é um chá
completo
de calor
que não provém
da mesma matéria
(do reverso?)
ou inverso sublime
cerebral


segunda-feira, 30 de julho de 2012

o absurdo
tem o ritmo
do caos
constante
nova ordem
aleatória

sexta-feira, 27 de julho de 2012

não
eu não escrevo
mais frequentemente
quando estou triste
em estado de mágoa
ou desamparo
é só minha morte
que ruma
e se configura
mais literária
(sem melodrama)
enquanto rabisco
em lenço enlameado
tudo que deixei
de te dizer
(cachorra!
ou seria
perdoa?)

(talvez essa seria
a diferença entre
eu e o poeta
sua expressão
mais direta
e precisa
ao que
de fato está
em voga
a universalizar-se)

ah! se eu te pego.

(pra quê tanto parêntesis?)

e tanto parente, então?

bem pior.
talvez eu seja
mais um acadêmico
com ar de neurastêmico
psicosociopata
endêmico
tantos genes
indecisos metamorfaram
meu bem viver
metamofaram sinapses
penso por fungos
mistos:
calor-umidade
nulidade-vida
Deleuze fumaria um cigarro
evitaria o olhar
ligaria para Foucault
enquanto poetas niilistas
bem que os intelectuais
tem um porque de existir
entre as espontaneidades
que vivenciam a terra em ato
e uma epifania mais
íngreme advinda
do próprio caos
da indiferença
pirei, será?
tento dormir

piscadela

e uma frase
reluta

nem se verbaliza

não há língua
a contá-la

só há sono

pestanejar

mesmo na
sobrevida
da maior
vigília
além tempo
noite fria lá fora, meu filho
não esquece o violão.

terça-feira, 24 de julho de 2012

chuva que já desce turva
ao olhar do passante
que apressado
se ressente
do passado
presente
vivido embotado
de tanta lágrima por rolar

sábado, 21 de julho de 2012

o que os apelidos com nomes de pássaros
(quero-quero, pica-pau, etc)
tem a ver com voar?

quarta-feira, 18 de julho de 2012

ah decência
sua indecente...

quinta-feira, 12 de julho de 2012

a rolha argentina
encerra o vinho chileno
sabor carvalho uruguaio
frutado pitanga brasileira

sóbrio à procura de motivações...
há um ar gelado do lado de dentro
economia entre os tapetes
tento ser mais suave
há tempos não escrevo um bilhete

quarta-feira, 4 de julho de 2012

0 3 d e j u l h o



noite adentro, vinha pela sombra
navegando entre Farrapos e Santo Antonio
viola em punho
entre damas da noite
e o baixo clero das esquinas
da estação até o ap

na cabeça palavras do falangeiro
um certo nequinho a caminho
filho homem ainda em grão
futurologia da fé mística, mesmo
já que de minha natureza

passada meia-noite
terreno inóspito
mas consciente, aliviado
inspirado subindo a ladeira
Garibaldi que de rua
se transmutou em vizinhança serrana

sentado na sacada curta
tateando a lua
(como se a fosse encontrar)
umedeci os lábios para
um dos últimos brindes musicais
uma ode ao filho que acreditei já conhecer
antevendo manias e personalidades

quatro anos depois
é promessa cumprida
é vida para além da vida
muito maior do que  qualquer prova material do divino
é divindade manifesta 
em sutil fôlego de pai
este sim, milagre instalado
em corpo fadado ao solo

olhe olhe olhe olhe o jeito do menino
deixe a presença prencher o ar
amo a esperança de tua imagem
a estrela

vamos jogar
ciranda, angola, capoeira
breve, leve
o eterno de mim
tão longe

musiquei
empunhando o violão
e nova vida em filosofia
em visão de caboclo
eis

quarta-feira, 27 de junho de 2012

terça-feira, 26 de junho de 2012

espero, espero, o espasmo
o vento, a brisa árida
silêncio é o convite que faltava
muito saber desnecessário
sinônimo empilhado
em prateleira redundante
onde a poeira é poesia:
cimento, resto de cobre, teia vencida
um ferrão morto.

a nova estrela é um prato proibido
limite matemático do físico.

terça-feira, 19 de junho de 2012

papai
sabe o que é um poema?
magia

sábado, 16 de junho de 2012

os poemas se repetem
porque a vida é ciclo
até que chega a bruma
e adensa sensações
torna mais espessos
textos passados

o que lemos
é a neblina
fonemas
ambíguos
mesmo quando
repletos de luz

domingo, 10 de junho de 2012

estabeleço contato com a realidade rude
e adoeço mesmo acalentado por sonhos
de bons comerciais
mas para descobrir a cara que tem
a felicidade e meu coração
sinto-me obrigado a partilhar
de um esquartejamento por dia
ligado em você

segunda-feira, 28 de maio de 2012

duas esfinges me devoram
por um punhado de mistérios
elas tem tudo tão ligeiro
do jantar ao travesseiro

quinta-feira, 24 de maio de 2012

d' um fotolog perdido

O movimento dá asas
e as despedidas pegadas.
E nesse espaço entre algo e alguma coisa
nasce toda certeza sobre o eu estático.
Basta cessar já desconheço o que aprendi na viagem.
Tenho a impressão de estar sempre de partida,
e tenho a ilusão de ver um futuro novo em cada dobrinha do firmamento.
E sigo, caminhos percorrendo,
quase sempre percussivos
impiedosos,
sem silêncio.
Porque o silêncio mora oculto no caminho.
O eu parado é só ruído.
Seguem-me as chamas descobertas na estrada.
E fecho a porta, e a vida é nada.
Porque a ânsia de partir é sempre maior que o sentido de chegar.
E tudo se acumula, imperceptivelmente
Até o dia caridoso de minh'órbita...




ligado 16 novembro 2005

quarta-feira, 23 de maio de 2012


tinha uma música
minha também
um texto sobre um texto
contava a aventura
de uma formiga
perdida quando transportada
por um caminhão de lixo
o aterro era seu novo paraíso
mas ela acabava assim:
(com um verso Pignatárico)
"do que me vale
todo luxo do lixo
se meus amigos
não estão
presentes"
um poeminha infantil
como bem sabe ser o pensamento
adolescente que se acredita adulto
embora memória esparsa
empoeirada, desmagnetizada
aprisionada em fita K-7
no fundo de uma gaveta
o fragmento se ressignificou
nessa manhã
quando dentro da romã
notei um mundo
a frase com sabor de quinze anos
inundou os sentidos
fez vibrar essas crendices faceiras
que se reaprendem
a cada colheita
enquanto a existência parece assim
essa fruta escancarada para a vida
com tudo aquilo que ela pode ser
entre bichos e sonhos e asas de cera
foi quando aprendi a tentar escrever
como refúgio
na tentativa incólume
de guardar uma ou outra semente

há, hoje, um suave aroma
um suco que evapora
restolho na ventania
mas que ainda flerta e musica
sua seiva obsessiva
de tanta adolescência
revivida

terça-feira, 22 de maio de 2012

segunda-feira, 14 de maio de 2012

não há horizontes
na minha madrugada
sei mais donde
nela
tu não mais
se esconde
"sessão de laser para olheiras"

mensagem endereçada a Caim

que matou seu irmão Abel

e não mais dormiu

em Guantánamo

no ipod:

discursos de Fidel

palestras criativas

entre celas e salas de sol

mais perfeitamente céu

fruto do poder da criação

ou do grande irmão

olho que tudo vê ou crê

poder vingar-se

você aí, nessa câmera

é Abel, meu irmão?

é Abel? meu irmão

morto

é
a medida em que precisamos de Mis bemóis
os dedos atrofiam

"que as cordas livrem minhas articulações
de transformarem-se em rios
intransponíveis de puro sentido"

uma vez que fui ao Uruguay
e deixei em casa o violão

sexta-feira, 4 de maio de 2012

a solitude
de uma compania
pouco arrazoada
pela sombra
da toada rude
da convivência
dissimulada.

quarta-feira, 2 de maio de 2012

d e z m e s e s


o que é o tempo, mesmo?
convertido em pedras
de calçada
de bazalto?

terça-feira, 3 de abril de 2012

p á s c o a by Felipe e Henrique


não sei o quanto resisto ou creio nas celebrações
ancestrais, mercadológicas...
pero que las hay, las hay...
resta cumprir.

quinta-feira, 29 de março de 2012

essa célula que não me pertence
que tanto ri e que se chama câncer
sobrevivente de uma tentativa de conto
ainda adolescente
escreve em ritmo frenético
sobre o mar e as andorinhas
sobre os afrescos parisienses
e as entresafras de boa arte e vinho californiano
é epilética e insegura
embora flua sem acidentes
pelas paredes arteriais
os muros que não nos separam
pontes elétricas
gênios mortos

gêmeos em humana jornada

sobrevida

quarta-feira, 28 de março de 2012

embora a paternidade
absorva a vida
que não sabia que tinha
é no sorriso do filho
que descubro
quem sempre soube
que sou

sábado, 24 de março de 2012



O homem
caça
e dá conta
de si
mesmo
apesar
da borracha
e da pirraça.

domingo, 18 de março de 2012

manhã de domingo
pura têmpera
em água se depura
puro tempo
apreciado ao silêncio
da chaleira
ímpeto se despede
da algibeira
e conforma-se

é melhor espreitar
vida assim
em tinta branda
para poder
sorrir sem memória
para poder mentir
pena sem alma

terça-feira, 13 de março de 2012

ela não tem a bolsa de futuros
sequer passado
sequer um gênero pensado
é o ente
na esquina da Júlio
que sorri entre dentes rasgados
e botulínicas bochechas
de araque
que talvez seja sincero
pai ou irmã de família
mas que desorienta
o herdeiro da bolsa sem futuros
que passa em meteórica
e autoexpressiva
conduta moral irretocável
paralelepípedos
testemunham
a soma das economias diversas
entre cobertas e conversas
descobrem-se
afãs
e nada explica
bocas desertas
a enfrentar rigorosos
outonos na serra
fruto da distância nominal
entre dois pontos que não se sabem
não se conhecem
(se encontram?)
as pedras contam
onde estão as veias
da cidade
por elas
só trafegam amorais
que estão em aberto
ocupam o meu o teu nome
dormem no meu ou no teu corpo
em qualquer noite dessas

e acordam

nas suas realidades absurdas
de fundos e pregões
acreditando na materialidade
da cesta básica
e da bolsa de futuros sem futuros
na humanidade cansada
e hipócrita
de nossos sonhos de ontem

sexta-feira, 9 de março de 2012

o sono que nos deixa
pouco antes da uma
talvez queira dizer
para banhar-me à lua
ao natural
deitado numa sacada
que sequer existe
mas que imagino tê-la
sob meus ombros
entre o pé do sofá
e a estante da sala

num assombro
triste pelo sono perdido
embalar Fransciso
que finge que dorme
mas já com índole de bandido
desata a relatar sua vida
e as passadas
reinventando os primeiros
sons de PE
os mais lindos até então
com disposição a percorrer
três Maracanãs

E depois que a atividade
se desloca para o intelecto
em desordem
miro lá embaixo
flores mortas e amarelas
que fogem ao vento
o ônibus que tarda em passar
e chegar
um funk gritado
de Cordeiro a Isaac Hayes
(de tão distorcido até fica bonito)
ar rajada que inventa melodias
(ou será que sou eu nessa febre inquieta
de madrugada matraca!)
tanta vida que passa
embora as grades
tanta energia
que realiza a cidade
(pra quê eletricidade?)

tão pouca coisa
que combina com paz
quase esqueço que não estou deslocado
que não inventei esse século
e nem o álcool
que ainda tenho 20,
quem sabe 30 e alguns anos
de criatividade
fruta madura
pra descer ladeira abaixo
na tentativa não exitosa
de sorver suavemente
meu pedacinho contente
de úmida burocracia

o pouco silêncio até tenta
mas não denuncia meu plano
de sabotar o sistema
nervoso central
e implantar um dvd pirata
com sons de mar
mantras de yoga
fés mais eucarísticas
em resposta a minha profusão dilema
espítito-Karde-cristian-budista
que acorda perto e depois da uma
compõe estrofes
redige laudas
tão sábias
quanto um bife ao ponto
sem sangue
sem carvão
sem tinta
o núcleo do que não entendo
o anti-senso
por certo
paradigmêsmico

quarta-feira, 7 de março de 2012

m o m

Perdi meu rumo
no reflexo do verão no céu
Não sei se posso culpá-lo assim
Não sei se devo dizer a mim mesmo que errei
Que falta ruim
Tua distância me causa
Volta
Chega de uma vez
Mas chega
com o inverno também
Pois o calor
já derreteu minha esperança
E o passado
Não mata mais minha sede

1998

quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

a chuva me desvenda
quando já não sei se tenho pele
macula o silêncio
que não mais existe
pouco molha
ou faz viver
porque estão extintas
terras e sementes

terça-feira, 28 de fevereiro de 2012

as vezes
e muitas vezes
sinto-me exilado
em Caxias
quando
entre um cacho e outro
de boas uvas
vejo meus amigos
na tela da TvCom
vivendo
absurdamente
de arte
E tantos momentos
ridículos surgem
quando percebo
que essa ânsia
do existir
impregna tudo
tão facilmente

súbito percebo:
de que arte estamos falando, mesmo?
de que amigos?
(me orgulhei)

o exílio é tão ou mais doce que a fruta
tão ou mais ridículo
do que esse nomeado folclore
anglo-saxão ítalo-burguês
muito mais real do que músicas e teatros
pseudo-cosmopolitas do sul

o centro tem o perfume
do interior rebuscado
que se atualiza
nos delírios de grandeza
de nós
transeuntes
entre esses estados
de prosa e desamparo
pelas carências humanas

Assim, perdidos
entre as migrações
e as identidades imperfeitas
não parecemos dignos da estética
embora a dor justifique
tanta expressão
efêmera e aleatória
conforme a música
se aproxima do fim
se desfaz dos refrões
e tenta o silêncio
se despe dos adereços
entoa pulsar sintomático
ecoa como único verbo
disponível ao ar
se dissipa
não mais como canção
sim vida,
impermanente

segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

meio África
meio Soho
perco o sono
após excessivo ninar
atropelo palavras
e ciência
pão e mel
me parasitam mosquitos
procuro amigos
além véu
onde não brindaremos
logo será a ante-véspera
da minha véspera
uma noite
que nunca chegará
visto que é dia
do lado de lá

sexta-feira, 24 de fevereiro de 2012

escrevo sobre uma criança
suas pequeninas mãos
olhos que a tudo bem recebem
ainda azuis
porvir...

se estivesse apaixonado
escreveria sobre o amor

embebido em dores
talvez narrasse um conto sujo

se morto?
não escreveria

ou escreveria torto
sobre o medo de estar morto
(mesmo na superação
dispomos de argumentos)

tudo mentira

nem que escrevesse tudo
chegaria a verdade

quem sabe no bloco
onde andam meus cadernos, mesmo?

se eu ainda flanasse pelas ruelas criminosas
de minha pequena cidade
com angústia e sangue entre os dentes
talvez,
ainda sorvesse de alguma materialidade distinta
de um gole mais perecível

tudo é perfeito em fundo branco
até mesmo o que penso
não pertence ao meu desejo
mas à luminosidade que rouba
de minha pele a pouca vida que aprendi

aqui
escrevo porque luto contra o silêncio
fúnebre do pasto interativo
do comboio de carentes
da luz que tinge a face de branco
e o peito de ocre
num estado de paz inventado
pela sutileza
da invasão bárbara
ao sentimento do ingênuo.

quinta-feira, 23 de fevereiro de 2012

se eu soubesse
o que o futebol faz
às minhas tripas
seria mais consciente

parâmetro a mais
para desvendar
as inconsistências
do sentido
e do sentir
rubro

de fato
só sangue não explica
embora vermelho
e enérgico
como os cantos
de beira
(além mar)
rio

acho que
prefiro
a ignorância

terça-feira, 21 de fevereiro de 2012

Aos 28 anos eu tinha meia vida no palco
14 anos
Quatro anos longe
e estou suspenso
no ar
esperando
pisar
num toco
de madeira
com cheiro
de flutuação
mais uma vez
anos
que cabem
no milésimo
de segundo
do desejo
quase
puramente
existencial


Liberdade o que é?
E amor?
Explica, vai
Explica

sexta-feira, 17 de fevereiro de 2012

é carnaval
e o sol se fantasiou da cor
da cor de dois
de dois
dois que não se beijam

e para se beijar
encontro da noite e o dia
qualquer dia
quero te encontrar

mantenha aberta as portas
do teu coração
ah o que é isso? não
não, não tem tristeza, não
é carnaval
deixa a alegria entrar

beba a tristeza
é carnaval

terça-feira, 14 de fevereiro de 2012

O que faz esse livro
a soleira da porta?
Haroldo de Campos
entre recortes de
Shakespeare
e Maiakóvski

Por que ali
ao chão
empoeirado?


Poesia?



Mantém a porta aberta.

sexta-feira, 10 de fevereiro de 2012

combato os vícios
com seus malefícios
a ira, o desgosto
café e vinho
com olhar desavisado
sobre o abdome
desamparado
tamanhos
problemas imateriais
a contemplar
perca peso (?)
pergunte (:)
me
como

quinta-feira, 9 de fevereiro de 2012

a janela defronte
vejo acesa pela primeira vez
uma visão inútil
não fosse o olho
porta do desejo

três horas depois
já voei até lá mais de cem vezes
pleiteando um só toque no vulto
macio que escandaliza
a noite da cidade

só para mim


sem pálpebras
o pouco silêncio possível
rasgado pelo ruído da moto
(donde ecoa a libido do viajante)
acelera e reativa
meus impulsos elétricos
do cerebelo rumo a fronte
a paz voa em duas rodas
onde vento, cabelos,
instintos se misturam
na carona
de volta ao corpo
Easy Rider
de apartamento
eu não falo de madrugada
falo da madrugada
estou nela
naquilo que vive em mim
tempo perdido
e indeterminado
noite dia adentro adiante

segunda-feira, 6 de fevereiro de 2012

o mosquito pinta na tela
o único sentido possível:
encontre um caderno
urgente
com bela capa
de preferência em couro flexível
uma borracha de presilha
caneta preta ponta fina
folhas canson ou pouco tratadas
com texturas de palimpsesto

quem sabe com as histórias
reescritas
encontre, perdidas
entre bravura e atos heróicos
a pouco poesia
que, de fato
valeu a pena
(invisíveis nos recados
e nos audiovisuais)

quarta-feira, 1 de fevereiro de 2012

se eu tivesse a fome
daquela criança
que aos seis meses
abre a boca
a espera
do que lhe oferecem
e sem protesto
engole amargo
o gosto
que a vida lhe provém
e dali baliza
todo resto
desde rancores
agruras
insônias
e máculas...
talvez,
se eu tivesse
mais uma chance
talvez não aceitasse
aquele mero
sal ou açucar