terça-feira, 29 de outubro de 2013

enquanto a Factory, o Warhol, o Lou Reed, o Stiff Little Fingers eram marginais, além deles o Ian Curtis, o Grinsberg, o Tom Zé, o Chacal, o Macalé, ... Eu pop digital. O que é a marginalidade nesse campo neutro da CIA? Onde é a margem da rede? é no nó, na conexão, na linha, no pixel, no código? O número de seguidores, a qualidade dos comentários, o potencial reprodutivo de uma cusparada? Há uma tímida sobrevida na rua, para quem se alimenta de detrito e escombros, o mais é sucesso, especulação e catarse evolutiva. Me dê a honra de ser a-histórico?

amigo inseto

adentro a madrugada, mas já em fuga, refletindo sobre o que a data 29 de outubro me fez e faz pensar nos últimos anos. sinto saudade de amigos que não vejo mais, de momentos, de sentimentos que tinha. tudo isso dói e impulsiona. porém vejo e por vezes encontro pessoas que não são mais elas, misteriosamente. elas não mudaram, elas deixaram de ser aquilo. e parece que quando nos cruzamos, num banco de café, numa fila de supermercado, estou diante de uma casca, um exoesqueleto de quitina desses, de besouro ou centopéia. casca dura, impermeável, rígida, seca e vazia, abandonada no pátio. parece que ali, tudo isso que me dói já não mora mais, misteriosamente sumiu. penso tudo sem remorsos, sem mágoa, mas como fenômeno mesmo. vai ver somos um pouco Artrópodes além de símios. e cínicos.

domingo, 27 de outubro de 2013

Laurie & Lou

lidei com um sentimento diferente hoje a tarde, ao receber a notícia da morte do Lou Reed. Através do Facebook notei homenagens, músicas, alguns comentários, logo abri um portal de notícias e na capa a confirmação. Antes de entender o significado, de abstrair as causas e consequências, pensei na Laurie Anderson, sua esposa. Já fui fã de Lou Reed, admiro sua obra, tenho alguns discos; certamente é um dos grandes personagens musicais da história. Nada disso passou pela minha mente ao vivenciar sua despedida. Pensei no luto de Laurie, na forma como recebera a notícia, nos derradeiros momentos, essas etapas marcantes que antecedem a perda. Me pergunto os motivos de sua imagem surgir assim, se tem relação com minha situação atual de proximidade com a família, o peito apertado pelo amor aos filhos, essas redescobertas cíclicas sobre o que realmente move a vida. Ou se essa intimidade deriva do breve contato que estabeleci com ela, nos camarins do Teatro do Sesi, tentando ser prestativo e acertar o acento do inglês ao mesmo tempo. Naquelas tardes e noites de extrema pressão, quando Laurie Anderson abriu o Porto Alegre em Cena, convivi um pouco com essa senhora elegante e de simpatia ímpar, que expressava gratidão em pequenos e contidos gestos, agia com respeito e leveza, em contraste à potência e vivacidade no palco. Na última noite, momentos antes da apresentação, ela chegou a me oferecer goles de seu vinho, que recusei, mas talvez isso tenha dado abertura para que eu a presenteasse com um CD de minha banda, SOL, No descompasso do transe retalhos do meu silêncio. Para minha surpresa, mas confirmando a sensação de conforto que o contato com ela favorecia, Laurie pediu que eu autografasse o disco, "it's yours? did you play? great!". Empunhei a caneta trêmula e timidamente, mas assinei com o pulso firme. Não tive qualquer pretensão com essa entrega, foi algo impulsivo, inexplicado, quase místico. Foi mentira, já não lembro mais. Espero que ele esteja bem nesse momento difícil, ainda não consegui pensar sobre o que será de Nova York, do noise ou de Win Wenders sem Lou Reed.

quarta-feira, 23 de outubro de 2013

eu brinco ou de fato carrego a angústia de nunca saber se verei o mundo amanhã com olhos de poeta ou de rei. não sei se voltarei a musicar palavras, se saberei articular melodicamente
minhas experiências traumáticas ou amorosas.
as desilusões
as terei? em que proporção ocuparão meu coração? ou minha dieta eficiente de carboidratos?
não sei se entendo porque preciso dessa aparência insatisfeita ou se a insatisfação é o moto-contínuo dos dias, dos minutos em silêncio contemplativo
guardo os poemas da adolescência, as músicas de quando loucamente apaixonado as declarações às amantes, às putas, às despossuídas
guardo tudo em fita magnética
onde o sentido já não é mais aquele
onde a voz infantil já é gutural
onde a própria memória já se apresenta velha e moribunda como minha teimosia de necessidade do poema
deite quieto, verme! 

domingo, 20 de outubro de 2013

eu artista eu biógrafo

"o artista vai onde o povo está"
e muitas vezes, traduzir o tempo em arte
significa aproximar-se, fazer concessões, ser polêmico
querer muito ser ouvido e amado
o artista sobrevive das incertezas
as suas e as de seu tempo
subitamente, a equação se inverte
amor e paixão distorcem as medidas
o público agora precisa dele
de suas verdades, de suas frivolidades
das formas intempestivas ou vazias
de entretenimento ou filosofia
consagrado, o humano entra em crise
não se reconhece, inebriado pela popularidade
vaidade compreensível e autêntica, porém ardilosa
quando o artista confunde-se com arte
quando imagina ser autônomo
sem necessidade de contato
da presença, do interesse pueril
porque sim, a tietagem sobrevive do mistério
a admiração é piegas e esse foi o caminho traçado
o criador sisudo morreu romântico tuberculoso
após as revoluções, as oportunidades combinam com as vedetes
delas dependem, a elas se amalgamam
e fornecem sentido ao realismo cotidiano
são o próprio imaginário concreto e sensível
é o ponto onde o artista não suporta mais
exige privacidade
pede o retorno a seu universo lúgubre criativo
repleto de melancolia e paz
como nos primeiros anos de anonimato
quando tudo que sonhava eram aplausos e afagos
ou apenas frases curtas e sinceras de compreensão
na condição de órfão, se imagina recluso
e conclama o público a defender sua individualidade
mas sua alma já pertence ao universo dos maus nascidos
dos herdeiros sem classe da mediocridade animal
ele se desvincula do escárnio onde repousam os homens
semi-deus reinventa o palco solitário da velhice senil
jaz improdutivo e amargo
capa da Caras ou de uma biografia não-autorizada

sexta-feira, 18 de outubro de 2013

toda essa poesia que não vivi
corta-me sem lirismo
só com saudade
que nem sei donde
nem quando
nem como

segunda-feira, 14 de outubro de 2013

há um eu cancioneiro
que atrapalha o eu ferreiro
na lida diária, sol a sol
mas sem viola, explico ao amoleiro,
adoecemos todos. eles, e o eu inteiro