quarta-feira, 27 de fevereiro de 2008

chicas linguagens

Meus olhos não podem medir tua boca
Porque palavras não pulsam
Nem coração, nem presença...
Para onde os sentidos confluem?
Ao mar
ou
a nascente?

terça-feira, 26 de fevereiro de 2008

lumbra y relevo



Corrosivo. A distância tomou conta de tudo, até mesmo da cumplicidade mais fecunda. Aqueles segundinhos alados de cerimônias tão particulares. Não nos surpreendemos mais com nossa relevância, tampouco notamos nossa existência. E assim é a vida se não existir o propósito de contemplar. Tudo pode passar num repente, de repentemente... é óbvio, não nos planejamos assim, não nos sonhamos, é simples. Mas na ordem aleatória dos sentidos e das pulsações precisamos tomar parte, eleger as prioridades de dentro. As de fora se tornam tão banais depois disso; se aglomeram numa fila de espera onde quem dita as regras é o acaso; uma desordem interior que retroalimenta a existência à espera de sentimentos prósperos, gerando ideais conciliadores. Chegamos ao fim da influência, em prol da decência sincera. Nos permitimos uma congruência infinita?

segunda-feira, 25 de fevereiro de 2008

ida a Zaratustra

Entre tantos lixos cósmicos um momento de torpor transcendental. Retícula, ou segundo de Lua Nova, entre nuvens, entre sais de gelo rarefeito, quase liquefeito, perfeito. Entre nuvem, entre sol, entre galáxia, seja sábia, seja breve, seja saciadora. Não agüentamos mais Fugazi, fajutos, ou verdadeiros, nem Coca-colas, ou Pepsis, enigmas de pirâmides ou Jersey´s new. Pode parecer platônico, pode soar anêmico, total delírio atômico, ou bomba de anti-mercantilismo, anti-colonialismo, anti-bacterindecididismo. Não é causa alguma! Apenas um cansaço de tantas hipérboles cosmopolitas, suas auto-suficiências bem organizadas, esses ideais... Por mais que soe breve, é uma cólica intensa, enrijece os músculos, propaga o estômago para frente, é ânsia! Joguei-me no momento, a ilha que percorreu, talvez, corpo de Buda ou de Cristo, a impermanência, ou a própria consagração do instante. Mas o que fazer com tanto? Ou para tanto? Salvo conduto do homem, o erro, talvez, seja mais importante. Aboliram o espelho do dicionário e os reflexos de todas as águas. Sou, nu e cru, tu.

sexta-feira, 22 de fevereiro de 2008

tocata

Fujo em desordem de desejos.
À rua, uma noite, mais outra...
ainda sempre na ânsia de te encontrar
ou me encontrar...
encontrar o que?
Esqueci a jarra enchendo na pia
Tão repentina transbordou que
Nado no apartamento!
Nada no apartamento.
Enxugo água
e enxugo tantos sentimentos
de tantos, ou todos os tempos.
Só assim parecem mais possíveis.
Só assim os sentidos colam nos delírios
E reinvento a vida ao dissabor das boas medidas.
As exatas.
Secaram todos os excessos
e ainda te espero
vestida com meu casaco
metáfora do meu corpo te envolvendo.
Porque a pele não exala mais essa fome de bicho,
está tudo em seu armário por tempo indefinido.
Ácaros, traças, vinhos escondidos
celebram minha libido.

quarta-feira, 20 de fevereiro de 2008

en tre linhas

Posso substituir as aspas
Para destacar teu texto
Ler, com todo respeito,
O indecente beijo dado
À meia-noite
Noite e meia adentro.

terça-feira, 19 de fevereiro de 2008

ser. naturalmente.



Uma laranjeira sem flores ou laranjas. Eu querendo desesperadamente um chá ou suco a plenas cinco horas da tarde. Tarde agradabilíssima de deleite, leitura, violinos e pássaros num bosque em frente a serra do mar. Tempo inerte de sobra para filosofar, retumbar entre pulmões e cedros antigos, refletir na transparência do gramado tranqüilo.
O texto da revista traduz o gênio de nossa raça contemporânea. Ter filhos já não é um ato natural. As necessidades tempo do homem, as balbúrdias em que nos metemos por hábito e obrigação desabilitaram o fator “continuação” da naturalidade de nosso ser. Dar seqüência à espécie parece mais um desafio para corajosos destemidos dispostos e grandes empreendedores do que uma simples tarefa realizável.
Preparativos, equipamentos, altos custos, riscos, investimentos, contaminações, más influências, discriminações, assessórios, educação, preparação, bactérias, ácaros, síndromes, fomes, choros, drogas, amigos, pedidos, desejos, descobertas, transformações, sentimentos, perdas, ausências, presenças, desligamentos...
Há tanta racionalidade sobre o ato de dar frutos que penso nas flores. O mais descabido disso tudo é que um impulso cega quando nos deparamos com esse futuro; um ser reflexo de nós sugere uma grandiosidade tão imensa ao milagre de viver que o único adjetivo capaz de traduzir a sensação é bobice.
Não sei se o nome desta estupidez leve invadindo nossa razão é amor, fé, ou destino; pode ser mesmo a manifestação desta natureza tão extinta hoje, essa sobriedade de tudo ao nosso redor, mas que nos falta tanto nas medidas mais simples. O homem, como um artífice de si e de seu ambiente se reconduz ao contato mais primordial quando examina aquele papelzinho do laboratório.
A seqüência de letras P-O-S-I-T-I-V-O remete a uma outra série de eventos; essas mesmas rotinas citadas acima, uma insegurança gritante, uma incapacidade de manter as pernas firmes, mas tudo compensado por uma moleza bem no centro do peito, um conforto macio e enigmático. Devo desvendá-lo aos poucos, mas por mais absurdo que possa parecer parece uma etérea certeza de que meu chá está a caminho, mesmo que esta laranjeira aqui em cima esteja sem flores e sem frutos; e toda sua seiva, folhas, caule sejam suficientes para a sombra, para inspiração de poetas, para a composição de belíssimas paisagens. Ainda assim, nossos filhos reclamam sua vitamina C e preciso de um chá para acalmar essa angústia da perpetuação. Quais serão os dilemas das laranjas para se tornar laranjeiras, ou de suas flores para cobrir o mundo de perfume e sabores tão essenciais?
Abelhas, polens, chuva, sol, adubo, húmus, acidez, PH, condensação, sublimação, direção e força de ventos, moto-serra, gado leiteiro, ácaros, secas...
A complexidade do simples é ter que encher o peito de ar,
A simplicidade do complexo é respirar todo momento involuntariamente.

sexta-feira, 15 de fevereiro de 2008

"contos contam contos"



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Estava pronto a nascer, percebia luz e cheiros com os fracos sentidos que me compunham. Uma forte ânsia expelia meu corpo daquela concha perfeita. Mas mamãe fez-me esperar mais oito dias. Desaprendi a voar.
Por excelência acendia charutos para meu avô aos sete anos e nadava 1500 metros de um só fôlego. Podia ser considerado feliz, estudioso, sadio e irrequieto com aquele tempo onde as navalhas ainda afinavam os rostos largos de uma família bonachona.
Tinha um amigo, que valha a pena narrar, só um, afinal, poucos hoje têm paciência de percorrer tortuosas linhas até descobrirem sozinhos meadas satisfatórias. Genialidade é artigo de quinta! Não precisamos mais. Separava-nos um rio de Prata, uma irrelevante diferença de idade e certas percepções contraditórias típicas dos quase dez anos.
Pois o gaúcho escrevia certos dilemas em forma de redação que me espantavam sobremaneira. Tinha astúcias e capacidades de corpo, mas transcritas em frases. Como se gingasse entre os fonemas ou os sentidos mesmo, criando jogos vezes absurdos, vezes extasiantes lá dentro do raciocínio. Fazia sinapses bailarem num ritmo de alguma substância boa, adrenalina, serotonina, sabe-se lá. Eu adorava ler o que escrevia e ele adorava escrever o que eu lia.
Compartilhávamos um jogo, e como meu vocabulário tinha profundas deficiências me especializei nos cortes físicos. Nadar, pandorga e aquela sapata. Do lado de lá do rio chamavam Jogo da Amarelinha. Aqueles quadrados numéricos onde a pedra vai delimitando o caminho com o objetivo de passar por todos números até o Céu; mistura cansativa de boa pontaria, coordenação motora, preparo físico, sorte, essencialmente, e muita prática. As velhas metáforas da vida em forma de passatempo metabólico de crianças hiperativas ineficientes...
Meu amigo nunca chegara ao céu. Nos dois anos que passamos juntos, freqüentando lugares comuns: bosques, buracos de fechaduras, armários madrigais ou campos de milho e araucárias, nunca conseguiu tocar o céu com seu pé 42, aos 12 anos. Porque aos 18, descobri mais tarde, já calçava 46; não tinha sapato na face da terra capaz de acomodar aquele polegar imenso. É. Um pouco deformado pelas insistentes tentativas da amarelinha e mais uma teimosia de sua mãe em aproveitar os calçados de um ano para o outro.
Sofria de doença rara, um gigantismo físico, mas que se transpôs para a alma também. E foi uma ave que cresceu sem parar, tentando alçar vôo, mas com um pesar sempre mais incrustado sobre as penas e os pensamentos.
Poderia não ser um grande escritor sobrevoando os horizontes universais das literaturas fáceis. Mas era um gigante, em todas suas proporções, com a leveza da palavra de fio concebido para o corte mais profundo.
Julio Oliveira morreu no mês do Vento Norte. Até crimes hediondos têm penas reduzidas nesta época, dizem que tais sopros induzem a insanidade. Melhor assim, deve ter vagado menos pelo limbo terreno, tendo alcançado, desta vez sim, um céu verdadeiro.
Naquele mesmo outono surgiram alguns brotos em mim. Aos quase setenta anos a tarefa é esquecer paulatinamente tudo que prometemos nunca fazer um dia. Justo porque tudo se dá, eficientemente, ao contrário daquele desdém. As genialidades, as idéias revolucionárias, jeitos diferentes de agir e pensar, acabam se tornando mais úteis às nossas páginas romanescas, a estes folhetins aguados de hoje. Escrevemos sem tinta, sem volúpia, sem o ranger áspero das datilógrafas. Somos macios, certeiros, construímos o texto, à maneira que o visualizamos pintando a tela. Substituímos, colamos, refazemos frases; e as possibilidades são infinitas e as combinações são testadas em execução.
É uma vida mais limítrofe. Realizar testando, aprovar fazendo.
A saudade que sinto do Julio é como da sanidade. Aqueles dias criança sonho entre pessegueiros e aroeiras matando formigas, passarinhos e infelizes. Não pelo fato da recordação, da saudade, melancolia rasgando o peito, mas porque hoje enlouqueço lentamente, em espasmos descontínuos, mas num paradoxo de sanidade absurda ao tudo sorver e narrar. Não passo de um personagem Cortázar.

quinta-feira, 14 de fevereiro de 2008

desdito impopular

loucos são os ocos.

p (o) e (m) n a

Estava testando o caderno
quando a caneta pifou.
Saber se foi erro de cálculo
ou bravata de Tupã.
Sim, era vermelho
e...
de pau-brasil.