terça-feira, 19 de fevereiro de 2008

ser. naturalmente.



Uma laranjeira sem flores ou laranjas. Eu querendo desesperadamente um chá ou suco a plenas cinco horas da tarde. Tarde agradabilíssima de deleite, leitura, violinos e pássaros num bosque em frente a serra do mar. Tempo inerte de sobra para filosofar, retumbar entre pulmões e cedros antigos, refletir na transparência do gramado tranqüilo.
O texto da revista traduz o gênio de nossa raça contemporânea. Ter filhos já não é um ato natural. As necessidades tempo do homem, as balbúrdias em que nos metemos por hábito e obrigação desabilitaram o fator “continuação” da naturalidade de nosso ser. Dar seqüência à espécie parece mais um desafio para corajosos destemidos dispostos e grandes empreendedores do que uma simples tarefa realizável.
Preparativos, equipamentos, altos custos, riscos, investimentos, contaminações, más influências, discriminações, assessórios, educação, preparação, bactérias, ácaros, síndromes, fomes, choros, drogas, amigos, pedidos, desejos, descobertas, transformações, sentimentos, perdas, ausências, presenças, desligamentos...
Há tanta racionalidade sobre o ato de dar frutos que penso nas flores. O mais descabido disso tudo é que um impulso cega quando nos deparamos com esse futuro; um ser reflexo de nós sugere uma grandiosidade tão imensa ao milagre de viver que o único adjetivo capaz de traduzir a sensação é bobice.
Não sei se o nome desta estupidez leve invadindo nossa razão é amor, fé, ou destino; pode ser mesmo a manifestação desta natureza tão extinta hoje, essa sobriedade de tudo ao nosso redor, mas que nos falta tanto nas medidas mais simples. O homem, como um artífice de si e de seu ambiente se reconduz ao contato mais primordial quando examina aquele papelzinho do laboratório.
A seqüência de letras P-O-S-I-T-I-V-O remete a uma outra série de eventos; essas mesmas rotinas citadas acima, uma insegurança gritante, uma incapacidade de manter as pernas firmes, mas tudo compensado por uma moleza bem no centro do peito, um conforto macio e enigmático. Devo desvendá-lo aos poucos, mas por mais absurdo que possa parecer parece uma etérea certeza de que meu chá está a caminho, mesmo que esta laranjeira aqui em cima esteja sem flores e sem frutos; e toda sua seiva, folhas, caule sejam suficientes para a sombra, para inspiração de poetas, para a composição de belíssimas paisagens. Ainda assim, nossos filhos reclamam sua vitamina C e preciso de um chá para acalmar essa angústia da perpetuação. Quais serão os dilemas das laranjas para se tornar laranjeiras, ou de suas flores para cobrir o mundo de perfume e sabores tão essenciais?
Abelhas, polens, chuva, sol, adubo, húmus, acidez, PH, condensação, sublimação, direção e força de ventos, moto-serra, gado leiteiro, ácaros, secas...
A complexidade do simples é ter que encher o peito de ar,
A simplicidade do complexo é respirar todo momento involuntariamente.

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