terça-feira, 27 de fevereiro de 2018

na esquina da Sinimbú com a Visconde de Pelotas passo por um florista que me oferece um arranjo de flores com nome de peixes, Alcaléa, Abrotéa, sei lá. não sou botânico, minha especialização é Administração. aceno um não com a cabeça e sigo pisando forte pela calçada com minhas certezas de novecentista.

sexta-feira, 23 de fevereiro de 2018

se eu não fosse um pouco surdo, talvez mutasse o mundo.

quarta-feira, 21 de fevereiro de 2018

as ondas quebram perfeitas ao fim da tarde no canto da ilha do Batuta. espelhos d'água deslizam em tom róseo depois de lamber as pedras da ilha rumo à terra firme. surfistas se amontoam para chegar nos lugares certos, onde uma ou duas braçadas serão suficientes como propulsão a jato até a beira. quatro ou cinco manobras, quem sabe um tubo pelo caminho. vez ou outra passa um cardume, um peixe espada, golfinhos. há quem esqueça desses detalhes, há quem na hipnose da onda perfeita esbraveje com os outros, defenda seu território, exija prioridades. o humano é bicho em terra e em mar. o sol se põe no lado oposto às ondas, na difusão das nuvens suaviza luz e sombra. enquanto todos disputam seu posto preparados para a próxima série, só consigo prestar atenção no som que vem da ilha, a umas cinquenta braçadas de distância. as revoadas de andorinhas, garças, maçaricos e seu lá que tantas espécies acomodam-se nas copas. e cantam em tons e harmonias tão variadas que quase competem com a maré e as ondas. quase pois não prestamos atenção, quase pois não recortamos a escuta a fim de ir até a ilha, encostar o ouvido ali, no pé ou no topo das árvores para desvendar o que os pássaros contam uns aos outros, antes de dormir. será uma oração? um acalanto? um plano de caça para o dia seguinte? memórias de outros pássaros? definições sobre as próximas migrações? apenas flutuo sobre as ondas, enquanto os parceiros de surfe recortam a superfície aquática a minha frente. não vou na série que irrompe estrondosa e macia em quase dois metros de espuma. retorno de um mergulho profundo e demorado após furar uma dessas e espero o chiar persistente das bolhas brancas da espuma evaporarem para ouvir os diálogos aéreos uma vez mais, antes da noite. uma lua se anuncia ali atrás, preciso de condução para a casa, mas perdi a vontade de prancha hoje, só quero voar.